“O mar aos poveiros
Embalou-lhes na espuma a alegre e doce infância.
E rimou-lhes canções d'amor na mocidade,
Deu-lhes na pesca - a vida - e aos filhos a abundância,
Deu-lhes, mais tarde, a morte, e aos filhos a orfandade"
Conde de Sabugosa
Anos 60
Havia borrasca na enseada. O mar encapelado, galgava o porto de pesca, passava a lota e inundava as ruas que estavam no seu caminho, fazendo da Rua 31 de janeiro o seu leito.
Quando mar estava tempestuoso, muito do que nele estava nas entranhas era "vomitado" como se Cronos ali estivesse, vomitando os seus filhos que o mar tinha devorado.
À areia vinha parar tudo, desde bocados dos velhos barcos que ali tinham afundado, como outros objetos, que o mar tumultuoso revolvia nas profundezas, e lançava para fora das suas gárgulas escancaradas.
Sei que me encontrava ali mais o meu irmão mais velho. Outros garotos por ali andavam, vasculhando o areal à procura de moedas ou algo de valor, que as ondas alternosas ali tivessem depositado.
O som do mar bravio era cortado pelos gritos de desespero das pescadeiras poveiras que olhavam o mar onde as pequenas traineiras tentavam a todo o custo entrar na barra.
Quando hoje olho para o mesmo local, o mar bonançoso, sei que muitos de agora, não acreditam que ali houve desespero e morte.
Era uma aflição. Impotentes perante aquela tempestade medonha que se abatera sobre os barcos dos seus “hómes”, rezavam aos santos protetores que os trouxessem sãos e salvos.
O salva-vidas faz-se ao mar tentando resgatar dele, aqueles que devido à força das ondas eram tragados dos pequenos barcos virados.
O mar trazia para a areia não só pedaços de madeira dos barcos ali sepultados, como dos que acabavam de soçobrar.
Saímos, não havia condições para ali continuarmos.
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