26.10.18

Cantores de rua

Todos os anos os via deambulando pela então vila de Póvoa de Varzim (cidade em 1973, através do decreto 310/73). Como era óbvio, via-os nos momentos de grande festejo na Póvoa, como era o da festa da Nª Sª de Assunção.

Ele com a viola, ela, cega, apoiava o braço direito no do homem e, na mão esquerda, levava muitas folhas bem elaboradas, com canções impressas que vendia a quem deles se abeirava para as comprar. A senhora tinha uma belíssima voz e, acompanhada à viola, cantava temas de desgraças e amores proibidos.

Era um choradinho que enternecia as almas de quem os ouvia. Paravam em locais onde houvesse muita gente, como no antigo Mercado Dr. David Alves, onde quase sempre estavam, mas também para os lados do Casino, local de referência de passagem de muitos turistas. A Póvoa nos anos 60 desenvolveu-se e já era uma vila de muito turismo, tanto pelas festas, como pelo mar.

Os poveiros são conhecidos pelos Lobos do Mar e esta era uma das canções. Ficou-me a letra na memória de tanto a ouvir cantar...

"Lobos do Mar

Numa praia de banhos, atraente,
Contente se banhava um rapazito,
Seu pai contemplara, alegremente,
A graça esfuziante do filhito.

O garoto sorria entusiasmado,
Mas nisto ouviu-se um grito lancinante,
Ele afastou se um pouco e foi levado
P'las ondas da corrente, apavorante.

Aos gritos aflitivos do pequeno
E ao ver dum pai extremoso a dor tão forte,
Um velho pescador, bravo e sereno,
Arrancou a criança ao seio da morte.

P'ra dar ao valoroso salvador,
0 pai tirou dois contos da carteira,
Mas, olhando-o de frente, o pescador
Não quis e respondeu desta maneira:

Tal dinheiro, senhor, longe de mim...
Meu nome não importa conhecer,
Porque os lobos do mar são sempre assim,
Não salvam por interesse, é por dever."

As lágrimas poveiras deslizavam pela singeleza, mas emocional letra. Os Lobos do Mar são sempre assim... rudes como o mar, mas sensíveis como crianças.

Podemos ouvir aqui este tema na voz de Frutuoso França


foto: três elementos junto ao Casino da Póvoa (anos 50), mas na minha época só vi dois.

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