19.11.10

A Ilha do Padre

Depois do nosso pai ter ido para Luanda, a minha mãe e todos nós, filhos, fomos morar para a Rua da Cordoaria, onde moravam já as nossas tias. Era uma casa cheia de garotada e não deveria ser fácil controlar tantos miúdos, mas certo é que até a nossa mãe ir para Luanda, com os dois manos mais novos, ali permanecemos.

Após a partida da nossa mãe, fomos para a casa dos nossos avós na “Ilha do Padre” que tinha entrada pela Rua Cego do Maio. Estivemos lá um ano, mas um ano que fez toda a nossa história de rapazinhos.

Do meu avô já aqui falei, Benjamim Lopes da Conceição, sapateiro no Mercado David Alves. Foi um avô que toda a gente gostaria de ter. Um grande amigo dos netos, um bom companheiro e amigo do seu amigo.

O amigo Ventura, eu e o meu Avô

A minha avó, Arminda Dias, era uma avó excepcional. Ia de aldeia em aldeia vender o peixinho fresquinho da Lota. Avós que nos deixaram saudades.


Um dia ao retirar uma panela de sopa do lume, ainda na Rua da Cordoaria (teria uns 8 anos), a panela virou-se e queimei o pé. Logo fugi de casa e coloquei-me em frente à entrada da Ilha do outro lado da Rua Cego do Maio (penso que havia aí um chafariz). A minha avó viu-me e chamou-me. Nunca me esqueci do que depois aconteceu. Não ralhou comigo. Tirou-me o sapato e o peito do meu pé era só bolhas de água. Foi buscar uma agulha e linha e passou a linha de um lado ao outro nas bolhas em cruz e deixou ali ficar. A água saiu, a pele secou e nunca mais vi marcas desse acidente.

Uma “ilha” como o nome indica, é um pátio em forma de U, cercado de habitações.

Nesta ilha, a entrada e saída era pela Rua Cego do Maio. A casa dos meus avós, tinha ligação para a Rua Dr. António Silveira (foto).

À entrada da Ilha morava a pescadeira Aurora, "A-dos-Assobios", mulher do que foi conhecido pelo "Ressuscitado". Depois havia a casa de banho comunitária, que não era mais que uma retrete com três buracos. Servia toda a Ilha. A seguir ficava a cozinha da minha avó, com o seu fogão a lenha. Já no virar do U a entrada para a casa dos meus avós. Em seguida penso que morava o dono (ausente no Brasil?) do casario e no andar por cima morou um padre (o tal que deu o nome à Ilha). À noite ouvíamos barulho vindo desse lugar diziam que era o espírito do padre que vinha até ali e arrastava a cadeira para ler. Até suávamos debaixo dos cobertores. Afinal eram ratos. Aquilo era tudo de madeira e já estava muito degradado.

Já no lado esquerdo, morava a nossa pequena amiga Rita. Um dia, no Carnaval, uma rabicha (bombinha ou bichas-de-rabear) entrou-lhe pelo peito e queimou-o. Foi uma aflição na Ilha. Quase na saída do pátio, lembro-me de uma moça que faleceu, creio que devido a apêndice. Como estava para se casar foi de vestido de noiva. Fiquei impressionado com a situação pois deve ter sido a primeira pessoa que vi morta com vestido de noiva. Parece que ainda estou a ver-me a subir as escadinhas que davam acesso a essa casa (tinha eu nessa altura 9 anos)

Nessa Ilha, na casa dos meus avós, passámos bons momentos e momentos assustadores. A luz do candeeiro a petróleo fazia com que a imaginação disparasse e algumas sombras tremulentas que pareciam passar ao fundo do corredor, faziam-nos estarrecer.

Na Rua Cego do Maio, saltávamos nas fogueiras dos Santos Populares, e assávamos as batatas. Era dali que partíamos para junto da lota e ouvíamos os pregões das pescadeiras na venda do peixe. Era dali que íamos até à praia para um mergulho ou ter com o amigo Xico Preu que nos levava até ao seu barco.

Foi um ano em cheio nessa Ilha do Padre da minha Póvoa de Varzim.

Quando lá voltei estava tudo degradado. Felizmente parece que a "ilha" hoje, em parte, foi recuperada.

Eu com o meu filho na entrada da casa dos meus Avós pela Rua Dr. António Silveira

23.3.10

Rancho Poveiro

Foi fundado em 1936 pelo etnógrafo António dos Santos Graça o mais representativo Grupo de cantares e dançares da nossa gente Poveira.

Se agora é conhecido por Rancho Poveiro foi com a designação de Grupo Folclórico Poveiro que se deu a conhecer por todo mundo, junto às nossas comunidades de emigrantes.


Os seus trajes são os usados pelos pescadores da Póvoa nos finais do século XIX, e neles predomina a “branqueta” (fazenda de lã branca) nas saias e nas calças e ainda a tão famosa camisola de lã branca, bordada a ponto de cruz com motivos marítimos, que as raparigas ofereciam aos namorados.


Este vídeo dedico a todos os Poveiros espalhados pelo mundo. Nele estão as canções que durante anos habituamos em as ouvir e fazem parte da nossa vivência enquanto miúdos, quando os nossos olhos eram o mar, e os pescadores lançavam à água as suas embarcações desafiando a fúria dos elementos.

É também dedicada a toda a minha Família, Poveirinha graças a Deus!

Bem-Hajas Rancho por continuares as nossas tradições no traje e na vontade de mostrares a todo o mundo o orgulho de ter nascido Poveiro.


Para todos, o meu Ala-Arriba pela Póvoa.